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sábado, 10 de novembro de 2012


VIOLÊNCIA SEXUAL
FICHAMENTOS

ROMERO, Karen Richter Pereira dos Santos. Crianças vítimas de abuso sexual: aspectos psicológicos da dinâmica familiar. Curitiba, Ministério Público do Estado do Paraná/Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Criança e do Adolescente, 2007.

Pág. 18
A violência doméstica contra crianças e adolescentes é um assunto que apresenta inúmeras dificuldades de identificação. Isso acontece por se tratar de situação que ocorre de maneira sigilosa, configurando, em muitos casos, um segredo familiar. Além disso, as próprias palavras utilizadas para se definir violência doméstica contra crianças ou adolescentes são utilizadas de modo indiscriminado, deturpando ou negligenciando a gravidade do problema. Exemplo disso é a utilização de termos como castigo ou disciplina.

Pág. 20-21
Na Constituição Federal Brasileira encontramos no art. 227, § 4º que: ‘a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente’. No Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 5º temos que ‘Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais’. No Código Penal art. 213 encontramos um aspecto interessante uma vez que o mesmo restringe o termo estupro apenas ao sexo feminino, definindo-o como ‘constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça’. Desta forma, quando se trata de indivíduo ou mesmo crianças do sexo masculino, compreende-se que não há conjunção carnal sendo o delito denominado atentado violento ao pudor, definido no art. 214 do Código Penal como ‘constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal’.

Pág. 28
[...] pode-se compreender o abuso sexual infantil como um fator estressante que acaba por atingir a criança em áreas onde ela apresenta maior vulnerabilidade. As repercussões da violência vivida dependerão também, além dos fatores anteriormente citados, da existência de uma capacidade de resiliência da criança.

Pág. 85-86
Tendo em vista a dificuldade de manejo e tratamento relativos à criança vítima de abuso sexual e sua família, vemos como sendo necessária a capacitação de diferentes profissionais que possam atuar nesses casos sob uma perspectiva multidisciplinar. Também, ao nos aproximarmos do assunto abuso sexual infantil, fica evidente a importância de que os psicólogos, sendo profissionais da saúde mental, disponham de conhecimentos profundos sobre a dinâmica do abuso sexual e suas repercussões para a criança, para a família e mesmo para o abusador. Isso permitirá um aprimoramento na qualidade das intervenções sejam elas de caráter clínico (tratamento) ou técnico (subsidiando casos na justiça).

Pág. 86
O abuso sexual contra a criança e o adolescente configura-se numa relação de transgressão, na qual a criança é tratada como ‘coisa’, sendo que a mesma não pode ser responsabilizada como aquela que provocou por seus atos a situação transgressora.

VIOLÊNCIA SEXUAL
FICHAMENTOS

CORDEIRO, Flávia de Araújo. Aprendendo a prevenir: orientações para o combate ao abuso sexual contra crianças e adolescentes - Brasília: Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude, 2006.

Pág. 3
Ocorre abuso sexual de crianças e adolescentes quando estes indivíduos em formação são usados para gratificação sexual de pessoas geralmente mais velhas, em um estágio de desenvolvimento psicossexual mais adiantado. Esta situação está presente em todos os meios socioeconomicos, religiosos, étnicos e culturais.
Abrange todo ato, exploração, jogo, relação hetero ou homossexual, ou vitimização, de crianças e adolescentes por um adulto, por um adolescente, ou por uma criança mais velha que, pelo uso do poder, da diferença de idade, de conhecimento sobre o comportamento sexual, age visando o prazer e a gratificação própria.

Considera-se que é abuso pois supõe o envolvimento de crianças e adolescentes em práticas sexuais às quais não possuem condições maturacionais biológicas nem psicológicas, fazendo com que seja impossível o consentimento consciente da atividade sexual. Trata-se de uma situação emocionalmente prejudicial e, em geral, acompanhada por outros tipos de maus tratos.
No abuso sexual, crianças e adolescentes são despertados para o sexo precocemente, de maneira deturpada. São desrespeitados como pessoa humana, têm seus direitos violados, e o pior: na maioria das vezes, por quem tem a obrigação de protegê-los.
O abuso sexual fornece à vítima informações errôneas sobre sexo e sobre a sexualidade, além de ser uma relação que envolve poder e conhecimento desiguais.

Pág. 4
O abuso sexual ocorre em diferentes culturas e classes sociais. Em função do contexto em que aparece, pode ser classificado como:
• abuso sexual extrafamiliar – ocorre fora do meio familiar, sendo praticado por alguém que a criança conhece pouco – vizinhos, médicos, religiosos
– ou por uma pessoa totalmente desconhecida. Normalmente envolve exploração sexual e pornografia;
• abuso sexual intrafamiliar – é aquele que ocorre no contexto doméstico ou envolve pessoas próximas ou cuidadoras da vítima. Aqui surge o denominado incesto, que atualmente é compreendido como qualquer contato sexual envolvendo pessoas com algum grau de familiaridade (madrasta, padrasto, tios, avós, primos, irmãos). Neste caso, a atividade sexual nem sempre envolve a força física e as vítimas freqüentemente são subornadas, coagidas ou verbalmente estimuladas ao ato sexual.

Pág. 4
Crianças e adolescentes podem ser afetados de diferentes formas e os sinais apresentados variam muito, desde a ausência de sintomas até a manifestação de sérios problemas físicos, emocionais e sociais.

Pág. 4-5
Os resultados do abuso podem surgir a curto e a longo prazo, com formas diferenciadas de acordo com a idade da vítima. É importante o conhecimento das diferentes fases do desenvolvimento infantil a fim de distinguir um sinal de maus-tratos de um comportamento que seja próprio da sexualidade infantil.

Pág. 5
Conseqüências Físicas
• lesões em geral, hematomas;
• lesões genitais;
• lesões anais;
• gestação;
• doenças sexualmente transmissíveis.
Conseqüências Psicológicas
• agressividade;
• condutas sexuais inadequadas;
• dificuldades nos relacionamentos interpessoais, de ligação afetiva e amorosa;
• dificuldades escolares;
• distúrbios alimentares;
• distúrbios afetivos (apatia, depressão, desinteresse pelas brincadeiras, crises de choro, sentimento de culpa, vergonha, autodesvalorização, falta de estima);
• dificuldades de adaptação;
• dificuldades em relação ao sono;
• envolvimento com prostituição;
• mudanças de comportamento e de vocabulário;
• queixas de ordem psicossomática;
• uso de drogas.

Pág. 6
Além de ouvir a vítima em ambiente apropriado, protegendo sua identidade, é necessário levar a sério suas palavras e acreditar no seu relato. É importante que a vítima se expresse a seu modo, com suas próprias palavras, sem ser induzida pois, caso contrário, corre-se o risco de a criança ou o adolescente se calar.

Cabe a quem escuta reconhecer a gravidade das descobertas e informar aos envolvidos sobre a necessidade de levar os fatos ao conhecimento daqueles que devem intervir para proteção da vítima. É preciso explicar à criança, de forma simples, clara e honesta, como se pretende ajudá-la e contatar, imediatamente, sua família.

Pág. 6-7
O abuso sexual é, na maioria das vezes, um fato mantido em segredo, o que dificulta sua identificação. O sentimento de vergonha, a dependência emocional, o fato de o abusador ser alguém da família, da possibilidade dele ser incriminado e submetido a penalidades legais, além da condição de provedor econômico são fatores que podem contribuir para a não revelação da situação.

Pág. 8
O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, em seu artigo 13, que casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos (inclui qualquer tipo de abuso ou violência) serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. Caso não haja Conselho Tutelar, a comunicação deverá ser feita à Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude e à Vara da Infância e da Juventude.
VIOLÊNCIA SEXUAL
FICHAMENTOS


LEA, Maria de Fátima Pinto; CÉSAR, Maria Auxiliadora (Org.). Indicadores de violência intra-familiar e exploração sexual comercial de crianças e adolescentes (Relatório Final da Oficina).
Brasília: CECRIA - Centro de Referência, Estudos e Ações Sobre Crianças e Adolescentes, 1998.


FALEIROS, VICENTE DE PAULA. A violência sexual contra crianças e adolescentes e a construção de indicadores: a crítica do poder, da desigualdade e do imaginário, pág. 7-18.

Pág. 10
A violência, que, no cotidiano, é apresentada como abuso sexual, psicológico ou físico de crianças e adolescentes, é, pois, uma articulação de relações sociais gerais e específicas, ou seja, de exploração e de forças desiguais nas situações concretas, não podendo, assim, ser vista como se fosse resultante de forças da natureza humana ou extranaturais – por exemplo, obra do demônio - ou um mecanismo autônomo e independente de determinadas relações sociais. Esta violência, manifesta, concretamente, uma relação de poder que se exerce pelo adulto ou mesmo não adulto, porém mais forte, sobre a criança e o adolescente num processo de apropriação e dominação não só do destino, do discernimento e da decisão livre destes, mas de sua pessoa enquanto outro. Esse uso (chamado abuso) do poder da força é, de fato, uma profunda desestruturação de uma relação de poder legitimado pelo direito e pelo diálogo, pela autoridade da maiêutica na dinâmica de ensino/aprendizagem mútua vivida no questionamento comum do mundo e na construção da autoridade legítima.

Pág. 10
[...] A figura de parente, pai, chefe de família não deve ser motivo para escusas e tolerâncias com o abuso ou a exploração sexual de crianças e adolescentes. A lei deve criminalizar as agressões, os assédios, os abusos, a exploração e criar mecanismos para que sejam responsabilizados os pais, padrastos e agentes do Estado, no exercício ou não de suas funções que venham a praticar essas
violações. O poder de pai não anula o outro como poder ser e ser de poder. Ao contrário, só se legitima ao construí-lo nos limites dos padrões civilizatórios dos direitos humanos, incluindo a sexualidade responsável.

Pág. 11
O desmonte dessa violência e a construção de uma cultura amorosa da criança e de garantia de seus direitos à sociedade implica denunciar permanentemente a quebra do respeito, da proteção e da construção das relações de trocas afetivas e de aprendizagem e também implica coibir os abusos, enfrentar as ameaças e os segredos, proteger as vítimas e as testemunhas.

Pág. 12
O combate e o desmonte15 da exploração sexual de crianças e adolescentes pelas redes e pelo crime organizado não pode estar, assim, dissociado, do combate e desmonte da violência intra-familiar (física, psicológica, sexual, social), na maioria, praticado dentro dos lares. A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes não se configura, em geral, como uma relação individual de um agressor ou explorador. Ela se constitui em rede, na busca de clientes para um mercado do corpo, sem a opção de quem é usado, na busca do lucro, com a sedução do prazer. Ela desconstrói e destrói as relações de proteção, de direito e aprendizagem da autonomia, pela intermediação do corpo e mercantilização da infância. O corpo da criança e do adolescente se transforma em valor de uso e em valor de troca em âmbito nacional ou internacional.

Pág. 13
O combate à violência intra-familiar e da exploração sexual de crianças e adolescentes implica responsabilização legal dos envolvidos, a denúncia, a declaração formal, a instauração do devido processo e o julgamento. Os aparelhos policial e judiciário precisam atuar, pois, na construção de uma cultura cívica da punição legal em oposição à cultura da impunidade, da chacota e desmoralização das denunciantes, do descrédito dos depoimentos de crianças e adolescentes e das pessoas pobres.

FLORES, RENATO ZAMORA. Definir e medir o que são abusos sexuais. Pág. 24-33

Pág. 24
[...] abusos sexuais contra crianças, produz, em muitos membros da comunidade, sentimentos de raiva e desprezo que fazem com que diversos agressores sexuais quando descobertos, sejam agredidos de maneira estremada, linchados, induzidos a suicídio e, já quase uma lenda urbana, currados nos presídios. Com freqüência, vítimas, testemunhas e familiares referem-se aos agressores sexuais como pessoas que perderam a sua humanidade, transformados, por seus atos, em espécimes de monstros apavorantes como os que povoavam nossos pesadelos infantis.

Pág. 26
Um aspecto relevante a ser considerado na definição de abuso sexual refere-se a questão da relatividade cultural. Embora alguns tipos de contatos físicos mais íntimos possam ser aceitáveis em grupos com diferentes culturas e concepções acerca da sexualidade, para
outros grupos, no entanto, o mesmo comportamento pode ser percebido como algo inadequado. Para um avaliador proveniente de diferente contexto social ou grupo étnico das pessoas envolvidas no caso avaliado, pode ser particularmente difícil identificar e compreender as interações abusivas, pois a percepção do que seja um comportamento abusivo é algo definido pela sociedade, e varia tanto no espaço geográfico quanto na dimensão temporal.

Pág 26
O abuso sexual pode ser definido, de maneira bastante generalista, como o envolvimento de crianças e adolescentes - logo, em processo de desenvolvimento - em atividades sexuais que não compreendem em sua totalidade, para quais não estão aptos a concordarem e que violam as regras sociais e familiares de nossa cultura.

Esta caracterização inclui basicamente três conjuntos de situações:
a) história de agressão sexual com violência física na qual o (a) jovem é a vítima.
b) interação ou contato sexual (como toques, relações sexuais, exibicionismo, voyerismo, etc.) entre uma criança e outra pessoa de qualquer idade em que a participação tenha sido obtida por meios desonestos, como ameaças, coerção moral, mentiras, deturpações de padres morais e táticas similares.
c) contato ou interação sexual entre criança ou adolescente e adulto, mesmo com a cooperação voluntária, em situações definidas por lei ou costumes como crime,  devido à presunção de imaturidade do (a) jovem e de responsabilidade do adulto.

Neste grupo estão incluídos os casos de exploração sexual. Poderíamos acrescentar uma quarta situação, um pouco mais complexa e menos freqüente:
d) falsas denúncias, pois no Brasil, como nos EUA, por exemplo, as conseqüências de uma investigação de abuso sexual, especialmente aqueles ocorridos no lar, são, para a família, devastadoras, com perda de emprego, divulgação pública, processos criminais e conseqüente abandono por parte de amigos e familiares. Este fenômeno foi denominado de "trauma secundário induzido pelo sistema".

Pág. 27
[...] abuso sexual é qualquer incidente de contato sexual entre crianças com menos de 16 anos e adultos em posição de autoridade (indivíduo com poder ou controle sobre a criança por qualquer período de tempo). Inclui, mas não se limita a: solicitação de contato físico, estupro oral ou genital, forçar a assistir ou participar de ato sexual, a assistir a vídeos pornográficos, a posar para fotos eróticas, manipulação, exibicionismo, sodomia e incesto.

HAZEU, Marcel; FONSECA, Simone. Exploração e violência sexual contra
crianças e adolescentes no Pará, pág. 34-43.

Pág. 34
A análise conceitual do tema violência e exploração sexual requer uma abordagem histórica da questão, oriunda de toda uma estrutura desigual da sociedade brasileira, pautada não só pela dominação de classes, como também pela imperante dominação de gênero e raça e ainda nas relações de autoritarismo estabelecidas entre adulto/criança.

Pág. 35
Relações sexuais forçadas (violência sexual) - quando nas relações estabelecidas, o
parceiro viola a liberdade sexual do outro. Pode ocorrer sem contato físico (exibicionismo, linguagem sexualizada, exibição de filmes pornográficos), por estimulação (toques e caricias inapropriadas, insinuantes), por realização de atos sexuais (sexo anal, oral, vaginal). Vale ressaltar que, quando trabalhamos com a categoria criança, sempre presume-se violência, em qualquer forma de relação sexual, um vez que a criança depende totalmente do adulto e não tem condições de definir sobre sua vontade sexual.

Com relação a adolescentes, estes são imaturos e curiosos sexualmente e podem até provocar o adulto com o intuito de definir sua identidade sexual. Pode-se questionar a origem dessa procura de crianças por adultos para realizar suas fantasias sexuais.

Pág. 35
Relações sexuais envolvendo exploração - quando na relação se tira proveito indevido do trabalho sexual do outro, o que ocorre no chamado mercado do sexo. Diversas atividades são desenvolvidas, como: prostituição (estabelece-se a troca de favores sexuais por bens materiais ou sociais); shows eróticos (imagem de atos sexuais é vendida ao vivo); pornografia (venda de imagens de relações sexuais e do corpo filmado ou fotografado); tráfico (promover a saída ou entrada do território nacional de crianças e adolescentes para fins de prostituição). No mercado do sexo, milhares de pessoas trabalham à margem da sociedade, por não terem suas profissões reconhecidas. Desta forma, ficam sujeitos a várias formas de exploração.
VIOLÊNCIA SEXUAL
FICHAMENTOS

TAQUETTE, Stella R. (org.). Mulher adolescente/jovem em situação de violência: propostas de intervenção para o setor saúde módulo de auto-aprendizagem. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2007.

Pág. 59
A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes, também conhecida pela sigla ESCCA, é considerada como uma questão social e prática criminosa, segundo os artigos 70, 82, 239, 240, 241, 250 do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Código Penal Brasileiro, com as modificações de 2004. Representa uma violação de direito humano fundamental, especialmente do direito ao desenvolvimento de uma sexualidade saudável, e uma ameaça à integridade física e psicossocial.

Pág. 59
Existem três formas primárias de exploração sexual comercial e que possuem uma relação entre si: a prostituição, a pornografia e o tráfico com fins sexuais, incluindo o turismo sexual. A violação está relacionada a algum tipo de transação comercial ou alguma troca e/ou benefício em dinheiro, ofertas ou bens, por intermédio da exploração sexual de menores de 18 anos. Ocorre uma relação de mercantilização (exploração/dominação) e abuso de poder do corpo de crianças e adolescentes (oferta) por exploradores sexuais (mercadores), organizados em redes de comercialização local ou global (mercado) e por consumidores de serviços sexuais pagos (demanda). O sexo torna-se objeto de consumo de falsas promessas e erotização, existindo uma ordem perversa de trabalho, em experiências de sobrevivência social.

Pág. 59
Em muitas cidades, existe um mercado com fins sexuais, em que o corpo de adolescentes (na maioria do sexo feminino, das várias classes, originadas de cidades do interior, zonas rurais, populações ribeirinhas ou bairros de periferia) é “abusado” ou “explorado” para uma demanda consumidora (na maioria do sexo masculino e mais idoso), numa prática clandestina, ilegal e, muitas vezes, ligada ao crime organizado, redes de tráfico sexual internacional ou redes de pornografia e erotização de crianças e adolescentes.

Pág. 59
Muitos dos turistas sexuais são agressores ocasionais, caminhoneiros ou viajantes dentro do próprio país, ou estrangeiros que se aproveitam de adolescentes desprevenidas ou já traumatizadas em situações anteriores, e que se submetem ou ficam seduzidas em troca de algum afago ou presente, que pode ser um prato de comida ou algum “trocado”. Geralmente são homens mais velhos que se justificam afirmando que foram “provocados” pelas adolescentes que estão em busca de dinheiro ou bens dados em troca, ou afirmando que o sexo com adolescente é “aceitável” e “natural” no país que visitam. O turismo sexual faz parte de toda uma rede de pornografia, pois as fotos e imagens são depois usadas, sem qualquer autorização e à revelia da adolescente e/ou de sua família, para fins comerciais, ou colocadas em redes virtuais, na internet. A proteção de crianças e adolescentes contra a ESCCA está prevista em códigos internacionais, tais como a Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança e contra o Crime Transnacional Organizado, que é considerada uma das Metas de Desenvolvimento do Milênio, documento das Nações Unidas e compromisso assumido e referendado pelo Brasil.

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Plano nacional de enfrentamento da violência sexual infanto-juvenil É um instrumento de garantia e defesa dos direitos de crianças e adolescentes, que visa à criação, ao fortalecimento e à implementação de um conjunto articulado de ações e metas fundamentais para assegurar a proteção integral à criança e ao adolescente vulnerável à violência sexual, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente. O processo de articulação e mobilização da sociedade civil e do governo, desde a década de 90, resultou na construção coletiva e participativa do Plano Nacional, discutido e aprovado num seminário nacional realizado em Natal, Rio Grande do Norte, no ano de 2000. Foi também firmado um compromisso denominado “Carta de Natal”, que se constituiu na expressão da vontade política desse Fórum, para viabilizar a implantação e implementação do Plano Nacional em todo território brasileiro. Este plano foi deliberado e aprovado no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), em julho de 2000 e, atualmente, as 27 Unidades Federadas já elaboraram e implantaram seus Planos Estaduais.

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O profissional que atende vítimas de violência precisa se instrumentalizar para registrar e notificar adequadamente a violência sexual. É importante registrar os casos com precisão e riqueza de detalhes.
Orientações para abordagem do profissional que atende vítimas de violência sexual:
- acreditar no relato da vítima;
- propiciar a ela um ambiente acolhedor e discreto;
- garantir sigilo sobre o caso;
- registrar informações a respeito do denunciante e da denúncia;
- identificar o local da ocorrência, circunstâncias em que ocorreu e a percepção de seqüelas na vítima;
- notificar ao Conselho Tutelar e à Secretaria de Vigilância em Saúde por meio da ficha de notificação/investigação individual sobre violência doméstica, sexual e outras violências;
- realizar, se necessário, contracepção de emergência e profilaxia de DST/AIDS;
- disponibilizar atendimento psicológico à vítima e à família;
- contribuir para a retirada do abusador do convívio da vítima.
O atendimento da vítima deve ter, como objetivo, interromper o abuso considerando as peculiaridades da dinâmica da violência intrafamiliar, em especial da violência sexual provocada por pessoas que têm laços afetivos com a vítima.

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O Conselho Tutelar é o órgão responsável em zelar pelo cumprimento dos direitos de crianças e adolescentes, previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Conselho é permanente, autônomo, não jurisdicional e composto por cinco membros, escolhidos pela sociedade, com mandato de três anos. O processo eleitoral é de responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, sob a fiscalização do Ministério Público.
Situações de negligência, discriminação, exploração, violência, abusos, crueldade e opressão, que tenham crianças e adolescentes envolvidos, devem ser encaminhados ao Conselho Tutelar.
Algumas das principais funções do Conselho Tutelar são:
- receber a comunicação dos casos de suspeita ou confirmação de maus tratos, e determinar as medidas de proteção necessárias;
- determinar matrícula e freqüência obrigatória em estabelecimento oficial de ensino fundamental, garantindo

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acesso à escola;
- solicitar certidões de nascimento e óbito, quando necessário;
- atender e aconselhar pais ou responsáveis, aplicando medidas de encaminhamento a programas e serviços necessários;
- abrigar em entidades adequadas;
- encaminhar ao Ministério Público as infrações contra os direitos de crianças e adolescentes.

VIOLÊNCIA SEXUAL
FICHAMENTOS


CFP - Conselho Federal de Psicologia. Serviço de proteção social a crianças e adolescentes vítimas de violência, abuso e exploração sexual e suas famílias: referências para a atuação do psicólogo. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2009.

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Violência sexual é violação aos direitos humanos fundamentais. Serviços especializados e continuados devem ser ofertados para crianças, adolescentes e famílias em situação de violência sexual que estão com os direitos violados.

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a violência sexual (abuso e exploração sexual comercial) é entendida como violação dos direitos humanos de crianças e de adolescentes. São formas de violência que ferem a integridade sexual de pessoas que, por sua condição peculiar, particular, seu estágio de desenvolvimento físico, emocional, afetivo e sexual, não estão preparadas para intercursos sexuais e trocas afetivo-sexuais. Para Faleiros, todas as formas de violência sexual podem ser consideradas abusivas e violentas.

[...] Considera-se, também, violação aos direitos sexuais e humanos, pois trata-se de relações estabelecidas com base na vontade e no desejo do adulto sobre a criança ou o adolescente, constituindo relações abusivas, permeadas pelo poder (econômico, geracional, de gênero, etc.). São, portanto, relações demarcadas pela assimetria.

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[...] a atuação de forma articulada, integrada, em rede, imprescindível, ainda que apontem as dificuldades de estruturação da rede: a morosidade do sistema de defesa e de responsabilização (segurança pública, Ministério Público e Justiça), as carências nas políticas de saúde e de educação, a insuficiência e, mesmo, a inexistência de vários serviços e ações fundamentais, a baixa qualificação de muitos profissionais que atuam nas organizações e nos serviços, enfim, as fragilidades da rede de atendimento, a precariedade e a insuficiência das políticas públicas, entre outros.

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A violência deve ser compreendida como produto de um sistema complexo, de relações historicamente construídas e multideterminadas, que envolve diferentes realidades de uma sociedade, assentadas em uma cultura, permeadas por valores e representações. Essa multideterminação implica, portanto, que voltemos nosso olhar para as diferentes realidades – familiar, social, econômica, política, jurídica – que estão assentadas em uma cultura e organizadas em uma rede dinâmica de produção de violência.

Pág. 34
A violência contra crianças e adolescentes faz parte de uma cultura baseada em concepções de infância, adolescência, sexualidade e violência que não estão descoladas das relações econômicas, de gênero e de raça que configuram a estrutura da nossa sociedade. Embora muitas vezes se esteja diante de um indivíduo e, no máximo, de uma família, não se pode perder de vista que a violência é sempre fenômeno a ser contextualizado e considerado em sua complexidade.

Pág 34-35
A complexidade do fenômeno da violência contra crianças e adolescentes é consenso, e muitos são os critérios utilizados para classificar os tipos de violência. É importante destacar que qualquer classificação é tentativa de organização, processo pelo qual fenômenos complexos são dispostos em categorias, de acordo com alguns critérios estabelecidos. Há clareza de que nenhuma classificação esgota a complexidade do fenômeno que abordamos, e devemos considerar que os diversos tipos de violência não são excludentes.

Pág. 35
Em linhas gerais, a violência contra crianças e adolescentes pode ser dividida em:
a) Intrafamiliar: quando existe laço familiar, biológico ou não, ou relação de responsabilidade entre vítima e autor/a da violência. Quando ocorre no espaço onde reside a família, é chamada também de violência doméstica.
b) Extrafamiliar: se o autor da violência não possui laços familiares ou de responsabilidade com o violado. Embora, na violência extrafamiliar, o agressor possa ser um desconhecido, na maioria das vezes, ele é alguém que a criança ou o adolescente conhece e em quem confia.

Pág. 35
Em relação às formas de apresentação, a violência contra crianças e adolescentes pode ser classificada como: negligência, violência física, violência psicológica e violência sexual.
a) Negligência: Ocorre negligência quando a família ou os responsáveis pela criança
ou pelo adolescente se omitem em prover suas necessidades físicas e/ou emocionais básicas para o desenvolvimento saudável. Consiste em falhas com os cuidados básicos e com a proteção da criança ou do adolescente, e deve ser distinguida da carência de recursos socioeconômicos.
b) Violência física: Dentre os tipos de violência, esse é um dos mais presentes nos estudos científicos. Os nomes mais utilizados são: abuso físico, maus-tratos físicos e violência física. Inicialmente, o fenômeno estava associado à Medicina e ligado ao espancamento de crianças pequenas; posteriormente, os estudos acerca da violência física passaram a ser encarados no nível transdisciplinar.
c) Violência psicológica: Também conhecida como tortura psicológica, abuso psicológico ou abuso emocional, é pouco reconhecida como violência pela maioria das pessoas. Só muito recentemente os estudiosos passaram a investigar essa modalidade.

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d) Violência sexual: Dentre as formas de violência contra crianças e adolescentes, a
mais perturbadora é, inegavelmente, a violência sexual, que, embora identificada com fenômeno antigo, só passou a ser considerada problema social a partir do século XX, quando foi inserida no contexto dos direitos humanos e considerada responsável por sérias consequências, como o comprometimento do desenvolvimento físico, psicológico e social de suas vítimas.

Pág. 36
O abuso sexual compreende uma série de situações que estão localizadas em um continuum que muitas vezes dificulta o estabelecimento dos limites entre o aceitável e o inaceitável, especialmente em uma cultura como a nossa, que sexualiza a infância.

Pág. 36-37
A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é uma forma de violência sexual que se caracteriza pela obtenção de vantagem ou proveito, por pessoas ou redes, a partir do uso (abuso) do corpo dessas crianças ou adolescentes, com base em relação mercantilizada e de poder.

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O fenômeno da exploração sexual de crianças e adolescentes é identificado em todo o mundo, e essa constatação tem mobilizado diferentes atores da sociedade no sentido de identificar, compreender e enfrentar essa cruel forma de violação de direitos.

Pág. 37
Prostituição infantil: É definida como a atividade na qual atos sexuais são negociados em troca de pagamento, não apenas monetário, mas que podem incluir a satisfação das necessidades básicas (alimentação, vestuário, abrigo) ou o acesso ao consumo de bens e de serviços (restaurantes, bares, hotéis, shoppings, diversão)

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Turismo sexual: Caracteriza-se pelo comércio sexual em regiões turísticas, envolvendo turistas nacionais e estrangeiros e principalmente mulheres jovens, de setores pobres e excluídos, de países do Terceiro Mundo. O principal serviço comercializado no turismo sexual é a prostituição, incluindo nesse comércio a pornografia (shows eróticos) e o turismo sexual transnacional, que acoberta situações de tráfico de pessoas para fins sexuais.

Pág. 38
Pornografia: Trata-se de produção, exibição, divulgação, distribuição, venda, compra, posse e utilização de material pornográfico.

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Em relação à criança ou ao adolescente, as consequências da violência estão relacionadas com fatores intrínsecos, tais como vulnerabilidade e resiliência (constituição psíquica, temperamento, resposta ao nível de desenvolvimento neuropsicológico) e com a existência de fatores de risco e proteção extrínsecos (recursos sociais, rede de suporte social e afetiva, funcionamento familiar, recursos emocionais dos cuidadores e recursos financeiros).